Sangue, corrupção e mentira marcam trajetória de PC Farias33 fotos
1 / 33
Paulo
César Farias era o nome por trás do "Esquema PC", rede de corrupção
responsável pelo primeiro impeachment da história do Brasil, o do
presidente Fernando Collor em 1992. PC foi tesoureiro da campanha
presidencial e depois intermediou interesses privados junto a órgãos
federais, além de bancar gastos particulares de Collor. Ele fugiu do
país em 1993, mas foi capturado em Bancoc (Tailândia). Em liberdade
condicional, PC foi assassinado em 1996 ao lado de sua namorada, Suzana
Marcolino Folhapress
Quase 17 anos após as mortes de Paulo César Farias e sua namorada, Suzana Marcolino, os quatro seguranças acusados do crime
vão a júri popular a partir da próxima segunda-feira (6), em Maceió,
para pôr fim a um dos casos mais misteriosos e emblemáticos da história
política do país.
Os policiais militares Adeildo Costa dos Santos, Reinaldo Correia de
Lima Filho, Josemar Faustino dos Santos e José Geraldo da Silva vão a
julgamento na 8ª Vara Criminal da Capital. O crime, porém, não tem
autoria intelectual apontada.
Apesar de não serem apontados como assassinos, os seguranças são
responsabilizados diretamente pela morte do casal, na madrugada de 23 de
junho de 1996, na casa de veraneio de Farias, na praia de Guaxuma,
litoral norte de Maceió. Eles eram responsáveis pela segurança de PC
Farias naquele dia.
Segundo a denúncia do MPE (Ministério Público Estadual), os seguranças
não afirmaram quem seria a suposta terceira pessoa na casa que teria
assassinado o casal e, por isso, foram considerados responsáveis pelo
crime.
"No momento em que o juiz pronunciou os réus, entendeu que não houve
uma ação dos acusados, mas sim uma omissão. Por serem seguranças e se
omitirem voluntariamente, dolosamente, respondem por essa morte. É a
mesma pena de homicídio. Essa é a imputação normativa da lei", afirmou o
promotor Marcus Mousinho, que fará a acusação no plenário.
Responsável por comandar as investigações, mas que não atuará no
julgamento, o promotor Luiz Vasconcelos usa palavras mais simples para
explicar a acusação contra os réus. "Se estão quatro pessoas em uma sala
e uma é morta, ou é porque foi um deles ou foi porque eles pactuaram",
disse.
Se condenados pelo crime, eles podem pegar até 60 anos de prisão. Pela
quantidade de testemunhas (27 arroladas) e provas técnicas que devem ser
apresentadas aos jurados, a previsão é de que o julgamento dure pelo
menos até a sexta-feira (10).
Demora
Paulo César Farias foi tesoureiro da campanha à presidência de Fernando
Collor de Melo, em 1989, e pivô de um escândalo que abalou a República.
Ele era apontando como a peça-chave de um esquema de tráfico de
influência e extorsão, supostamente comandada de dentro do Palácio do
Planalto. Em 1992, as denúncias resultariam num final já bem conhecido: o
único impeachment presidencial da história política brasileira.
A morte de PC Farias poderia interessar a muitas pessoas "influentes",
que teriam participado do esquema PC. Quatro dias após a morte, o
ex-tesoureiro iria depor na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das
Empreiteiras. A fala de Farias era aguardada com expectativa, o que só
aumentou as especulações sobre uma possível "queima de arquivo."
Por conta dessas nunces, a investigação foi um processo complexo,
cercado de pressão política e que levou três anos até chegar à fase
final de indiciamentos. Mesmo com o esforço das autoridades que
investigaram o caso --que concluíram se tratar de duplo homicídio-- a
autoria intelectual nunca foi identificada, e o caso chegou à Justiça
incompleto.
A denúncia só foi aceita pela Justiça em março de 2000, quase seis anos
após o crime. Segundo o juiz Alberto Jorge Correia, que pronunciou os
réus, a demora na Justiça ocorreu por conta dos inúmeros recursos
impetrados na defesa, até o STF (Supremo Tribunal Federal).
"Em todo lugar do mundo você tem dois graus de recurso. No Brasil você
tem quatro", disse, citando ainda que se passaram cinco anos para que o
ministro Joaquim Barbosa negasse o recurso de prolação de denúncia e
autorizasse a convocação do júri. "Mas não é culpa dele, que tem 50 mil
processos para julgar. É culpa do sistema", disse Correia, que também é
professor de direito da Universidade Federal de Alagoas.
Segundo o promotor Marcus Mousinho, em termos técnicos, não há prejuízo
pela demora. "Todas as provas produzidas estão nos autos, tecnicamente
não faria diferença. Mas numa visão simbólica, prejudica, pois a
sociedade tem memória fraca e sempre espera a resposta. Essa demora é
como não houvesse Justiça. Além do sistema processual penal brasileiro,
houve uma série de perícias, além da própria substância do fato",
afirmou.
Ampliar
Relembre brigas entre os irmãos Collor12 fotos
2 / 12
15
mar. 1990 - Posse do presidente Fernando Collor de Mello. Ele foi
eleito ao vencer Luiz Inácio Lula da Silva, com pouco mais de 50% dos
votos Leia mais Jorge Araújo - 15 mar. 1990/Folhapress
Reviravolta
O caso PC é um dos mais polêmicos do país por guardar, em seu
histórico, mudanças de rumo e trocas de acusações entre peritos.
Inicialmente, as investigações apontaram para um crime passional --com o
assassinato do ex-tesoureiro por sua namorada, seguido do suicídio de
Suzana. Quase dois anos depois, a versão oficial foi mudada para duplo
assassinato, resultando na denúncia dos acusados que vão sentar no banco
dos réus.
O pivô da mudança foi o professor de medicina legal e então coronel da Polícia Militar de Alagoas, George Sanguinetti.
Ele questionou a versão de crime passional e, a pedido do MPE, após dar
uma série de entrevistas sobre o caso, produziu um laudo técnico
contestando a então perícia oficial, que foi apresentado pelo legista
Fortunato Badan Palhares.
"O Estado teve interesse que o caso fosse arquivado como passional. As
autoridades alagoanas trabalharam para tornar o caso um crime passional,
mas não foi. Ele morreu porque era um arquivo vivo. A morte de PC foi
um crime político-financeiro. O caminho percorrido pelos que tramaram
está nos autos. Não precisa ir longe. Suzana foi uma coadjuvante, estava
no lugar errado, na hora errada", disse.
O UOL procurou Badan Palhares, mas ele não se
pronunciou sobre o caso. Palhares é uma das testemunhas arroladas pela
defesa e pela acusação.
Defesa contesta
Para a defesa, a versão de duplo assassinato não tem fundamento. No
júri que começa na próxima segunda-feira, o advogado dos réus, José
Fragoso, vai defender a tese de que, naquela noite, os militares
acreditavam que PC e Suzana estavam dormindo normalmente e não houve
qualquer invasão de terceiros ao imóvel. "Essa denúncia é absurda, sem
fundamento. Suzana matou PC e depois de se matou", disse.
Para Fragoso, o que teria motivado o crime seria a iminente separação
de PC Farias. Aí entra em cena outro nome da trama: Cláudia Dantas,
suposta última paixão do ex-tesoureiro. Cláudia é filha do ex-prefeito
de Batalha (179 km de Maceió), José Dantas Rodrigues, e que foi
assassinado em 1999. Segundo relatos que estariam contidos nos autos, PC
teria dito que iria acabar o namoro com Suzana, o que teria provocado
fúria da então namorada.
"No dia 10 de maio, PC disse a Cláudia Dantas que iria romper com
Suzana, mas que queria um tempo. No dia 22 junho, às 17h, ele ligou para
o pai de Dantas, dizendo que ia romper o relacionamento naquele dia.
Ela estava sentindo o abandono, tinha perfil de alto risco para o
suicídio. Naquela madrugada ela tinha bebido e tinha visto que todo
aquele castelo estava ruindo. Se alguém tinha interesse em calar Paulo
César, Suzana chegou antes e o fez", disse o advogado, afirmando ainda
que Suzana teria interesses financeiros no namoro com PC Farias.
"Suzana era um pessoa que, havia muito tempo, estava atrás de um
companheiro rico, que a sustentasse bem. Isso é a verdade. Ela foi
apresentada à Paulo César pela Carlota, que se tratava de uma cafetina.
Mas Paulo César não a tratou como prostituta, tratou-a como a namorada, e
ela se vangloriava disso, dizia a todo mundo. Ocorre que em um ano três
meses de namoro, muitas coisas aconteceram, como brigas e duas
tentativas de suicídio", garantiu, explicando os motivos da separação.