BRASÍLIA E RIO - Nas alegações finais do segundo dia de
julgamento do mensalão,
o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pediu a prisão
imediata de 36 dos 38 réus do caso, logo após a conclusão do julgamento.
Nas alegações finais, ele solicitou a absolvição de Antônio Lamas e
Luiz Gushiken, por “insuficiência de provas”. Durante a sessão realizada
nesta sexta-feira, Gurgel também reafirmou que José Dirceu era o líder
do esquema de corrupção.
(Confira como foi a cobertura em
-
A Procuradoria Geral da República, no exercício de sua função,
comprovou a acusação que fez contra 36 dos acusados Em relação a dois,
nas alegações finais, pedimos absolvição por insuficiência de provas.
Mostramos graves crimes que foram cometidos, suficiente para condenação.
Jamais um delírio foi tão materialmente documentado. (...) A
Procuradoria Geral da República requer desde já a expedição dos mandados
de prisão cabíveis imediatamente após a conclusão deste julgamento -
disse.
Gurgel terminou suas alegações finais com um trecho da
música “Vai passar”, de Chico Buarque ( “Dormia a nossa Pátria Mãe tão
distraída, sem perceber que era subtraída em tenebrosas transações”).
“José Dirceu foi o mentor da ação”
Foram mais de cinco horas de sessão. Logo no início, o procurador voltou a falar que José Dirceu era o “mentor” do esquema.
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José Dirceu foi o mentor da ação do grupo e seu principal protagonista -
disse, ressaltando que “nada acontecia sem o consentimento” do petista.
Segundo o procurador, “Dirceu está rigorosamente em todas”.
Sílvio Pereira, Delúbio Soares e José Genoino também foram citados pelo procurador como membros do núcleo político do esquema.
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Genoino representava Dirceu e formulava as propostas de acordo com os
partidos. Mesmo negando ter feitos acordos financeiros, ele assumiu que
se reuniu com o PP para tratar de alianças políticas - disse,
ressaltando que Genoino “avalizou supostos empréstimos em valores
milionários tomados por Marcos Valério nos bancos”.
Quanto a
Delúbio Soares, Gurgel falou que ele era o elo entre o núcleo político,
comandado por “José Dirceu, e operacional e financeiro, operados por
Marcos Valério”.
Valério era o ‘cabeça’ do núcleo operacional
Valério
é apontado por Gurgel como o “cabeça” do núcleo operacional do esquema
do mensalão. Ele era presença garantida nas negociações de doações de
campanha para o PT.
Segundo o procurador, o publicitário se tornou
um articulador do grupo político e intermediou encontros entre empresas
e o governo federal.
- As empresas de Marcos Valério abrigavam
recursos com absoluta segurança - relatou o procurador. Simone
Vasconcelos, diretora administrativa e financeira da SMP&B, também
foi citada pelo procurador:
- Há relevantes documentos nos autos
sobre o papel que (Simone) exercia no esquema financeiro. Cabia a Simone
a função de entrar em contato com os destinatários dos valores
informando que os valores estavam disponíveis. Em certas ocasiões, ela
teve que contratar carros fortes para o transporte dos recursos. Em
certa ocasião, um carro forte levou R$ 650 mil reais para o prédio onde
funcionava a sede da SMP&B em Brasília.
Entre as articulações de Valério estaria a feita com o PTB, segundo explicou Gurgel:
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O PTB tinha a perspectiva do pagamento de R$ 20 milhões, ajustado com
José Dirceu, que ocorreu o acerto da viagem de encontro entre Marcos
Valério e o presidente da Portugal Telecom. Roberto Jefferson, apesar de
seus esforços, não conseguiu receber os R$ 16 milhões restantes.
Núcleo financeiro era operado pelo Banco Rural
O procurador disse que a diretoria do Banco Real era responsável pelo núcleo financeiro do esquema do mensalão.
-
O banco não tinha preocupação em receber os empréstimos, e os tomadores
não tinham preocupação em pagar. (...) O banco viabilizou a
distribuição dos recursos sem comunicar aos órgãos de controle o
destinatário final. Empréstimos foram concedidos sem a exigência de
pagamento por quem quer que fosse. Nem a empresa de Marcos Valério, nem
PT, nem avalistas dos contratos deram garantidas que poderiam ser
qualificadas como razoáveis ou aceitáveis - explicou o procurador em seu
parecer.
O procurador complementou: - Perícias comprovam que os
parlamentares receberam pessoalmente vultuosos valores em dinheiro
obtidos em esquema de lavagem feita por Marcos Valério e seu grupo,
assim como o Banco Rural.
Gurgel explicou que, para fugir das
denúncias, os parlamentares articularam tese conjunta de que não houve
pagamento de vantagem para que votassem a favor do governo federal:
-
Para eles, tudo não se passou de inocentes acordos. No entanto, eles
não conseguiram apresentar nenhum argumento sustentável justificando por
que os acordos envolviam sempre entrega de dinheiro em espécie por meio
de esquema ilícito de lavagem.
“Condições fisiológicas”
O
ministro Ayres Britto pergunta se Gurgel poderia fazer uma pausa. Como o
procurador-geral pretendia continuar, o ministro Marco Aurélio alegou
que os julgadores não teriam “condições fisiológicas” de esperar muito.
Entre risos, a sessão foi suspensa por meia hora, e voltou por volta das
17h20. Gurgel voltou a ler a acusação dos réus.
Logo após terminar as acusações sobre o crime de formação de quadrilha, Gurgel disse:
-
Se o dinheiro (recebido por João Paulo Cunha de Delúbio Soares) era
lícito e pertencia ao PT, nada mais lógico que fosse transferido pelo
sistema bancário. Como justificar que absolutamente tudo era sempre
feito desse modo escuso? Se o dinheiro era do PT, não havia
justificativa para um cheque emitido pela SMP&B. Há inúmeras
referências na literatura especializada sobre o emprego de parentes para
o recebimento de dinheiro (de corrupção).
Sobre o desvio de
recursos do Banco do Brasil (episódio Visa Net), Gurgel afirmou que o
diretor de Marketing do banco, Henrique Pizolatto, desviou dinheiro
público.
- Os recursos que viabilizaram o esquema foram obtidos
pelo Banco Rural. Outra parte, entretanto, foi o desvio de recursos
públicos. Comprovou-se que Henrique Pizolatto, na condição de diretor de
marketing do Banco do Brasil, desviou entre 2003 e 2004 o valor de R$
73 milhões oriundos do Fundo de Investimentos da Visa Net. (...) A
gestão de Henrique Pizzolatto foi marcante por dois aspectos. Primeiro
lugar, alterou os formatos do repasse via Visa Net, e, em segundo lugar,
porque concentrou os repasses às empresas de marketing de Marcos
Valério.
Duda Mendonça assumiu titularidade dos recursos
De
acordo com o procurador, Delúbio Soares determinou a Marcos Valério que
procedesse o pagamento de dívidas de R$ 11 milhões contraídas com Duda
Mendonça e Gilmar Fernandes durante a campanha eleitoral de 2002. A
partir dessa determinação, Marcos Valério teria assumido o pagamento da
dívida, passando a tratar o assunto com Gilmar Fernandes. A primeira
parcela da dívida foi paga em fevereiro de 2003.
- Duda Mendonça e Gilmar Fernandes exigiram que o valor fosse depositado em conta no exterior. Para isso abriram empresa
offshore
nas Bahamas. Utilização de empresas para este fim constitui lavagem de
dinheiro. Após divulgação pública, Duda Mendonça assumiu titularidade
dos recursos. Ao contrário do que afirmada em suas defesas, a exigência
de depósito no exterior foi feita por eles, e não por Marcos Valério.
Pedida a absolvição de Gushiken e Lamas
Ele
ainda sustentou que o crime de corrupção não exige um ato de ofício.
Gurgel começou a explanação com análises dos pensadores Raimundo Faoro,
Max Weber, Norberto Bobbio e Maquiavel, entre outros, para mostrar que o
grupo, supostamente chefiado por Dirceu, adotou a “ética de resultados”
para financiar projetos políticos e pessoais com recursos públicos. O
procurador descreveu a participação de cada um dos 38 acusados de
envolvimento do mensalão, conforme a denúncia original. Pediu a
absolvição de Luiz Gushiken e Antônio Lamas, por falta de provas.
O
procurador sustenta ainda que, logo depois da ajuda financeira, Dirceu
abriu as portas da Casa Civil para a ex-presidente do Banco Rural Kátia
Rabello. O banco estava de olho na liquidação extrajudicial do Banco
Mercantil de Pernambuco. Em nota, o banco disse que as acusações do
procurador são infundadas.
Pelas acusações do procurador-geral,
José Genoino e Delúbio Soares fizeram acordos políticos com o PTB, de
Roberto Jefferson, e o PL, de Valdemar Costa Neto, entre outros
partidos, com a supervisão de Dirceu. Em depoimentos durante a
investigação, Jefferson, Emerson Palmiere, ex-dirigente do PTB, Genoino e
Delúbio sempre ligavam para Dirceu para avisar ao chefe sobre os
resultados das reuniões do grupo com aliados políticos. Genoino e outros
acusados disseram que os acordos eram políticos e não comerciais. Isso
eliminaria o caráter ilegal das transações. Gurgel rejeitou as
explicações.
Ex-presidente da Câmara e atual candidato à
prefeitura de Osasco (SP), o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) foi um
dos réus que mais receberam atenção de Gurgel. Por mais de 20 minutos, o
procurador geral falou das três acusações contra o petista.
Segundo
Gurgel, Cunha recebeu vantagem indevida para que uma das agências de
Valério ganhasse a conta de publicidade da Câmara. Além disso, usou a
empresa de Valério para que ela subcontratasse outra empresa.
Oficialmente, ela prestaria serviços para a Câmara, mas na prática
trabalhava para o próprio Cunha.