Legenda : Mesmo vítimas da ditadura, Yara e Míriam ainda nos ensinam sobre perdão
Quase 50 anos se passaram e a pedagoga Yara Cunha ainda aguarda um
pedido de perdão dos Militares. Em maio de 1971, quando ainda tinha 28 anos,
ela foi presa pelo regime militar e levada para uma Casa de Detenção na cidade
de Salvador, capital baiana.
Diferentemente de algumas outras vítimas da ditadura militar (1964-1985), a
professora cumpriu pena em uma prisão civil, que segundo ela tinha mais
flexibilidade em relação às militares.
Desde que conheci Yara, sempre tentei encontrar uma maneira de conhecer um
pouco da sua história, e, entre um papo informal e outro, uma palavra solta
daqui e outra dalí, ela começava juntar forças para me levar à um passado que
não era meu, porém com muito significado.
Além de uma pessoa resiliente, percebemos em Yara um coração perdoador. Isso me
provoca alguns questionamentos, pois a jornalista Miriam Leitão, também vítima
da ditadura e uma profissional de Comunicação que me inspira, disse em uma das
suas entrevistas que não tinha mágoa e tão pouco ódio desta referida época.
Engraçado, mas é um sentimento perceptível na professora. Isso a faz admirável
e desperta em mim, ainda uma foca no jargão jornalístico, o desejo de viajar
neste passado sombrio, que as duas, tanto Míriam quanto Yara, ainda conseguem
ensinar sobre perdão.
O ir e vir no passado da professora Yara surge também como contribuição para o
reconhecimento dos erros cometidos pelo Estado durante o regime militar.
Eu não posso deixar de ser justa. A minha maior fonte de inspiração e coragem é
o companheiro Matheus Leitão, que surge com a obra Em Nome dos Pais, contando a
trajetória de Miriam na prisão. Ali eu comecei a perceber que, além da
jornalista, muitas são as mulheres que sofreram e estão no anonimato, sem
oportunidade de falar da época dolorosa, sofrida e cheia de repressão.
É na pesquisa de Matheus Leitão que venho achando coragem para sequenciar
o nosso trabalho. Não posso negar que é doloroso, muito delicado, mas deixando
a lágrima na garganta, as vezes saindo pelos olhos, nós estamos conhecendo um passado
que ficou trancado para a professora Yara Cunha durante quase cinco
décadas.
Penso que o tempo para conseguir todas as informações será longo, mas, a cada
conversa, uma nova Yara se conhece. E cresce a minha admiração. Impossível não
se envolver. Neste momento percebemos que a famosa imparcialidade que estudamos
na Academia, não passa de mito.
Quando depôs à Comissão da Verdade, Yara sempre procurou o seu lugar na
história, no sofrimento causado pelo Regime Militar. Em meio a desaparecimento
e mortes ela minorou o que tinha ficado pra si. Mesmo assim, ela não nega o
sofrimento, o medo, pavor e as incertezas. (Clécia Rocha)