Todas as compras de medicamentos realizadas no país para o abastecimento do Sistema único de Saúde (SUS) terão seus preços registrados em sistema online. A resolução, publicada no Diário Oficial da União, vale para o Ministério da Saúde, estados, municípios e Distrito Federal que, agora, passam a alimentar de forma obrigatória o Banco de Preços em Saúde (BPS). A ferramenta online é gratuita e de acesso aberto ao público desenvolvida pelo governo federal. "É uma ferramenta que possibilita ampliar o nível de negociação entre os gestores e fornecedores na compra de medicamentos, isso significa expandir o acesso, reduzir custos e otimizar os gastos com saúde, dando possibilidade ao gestor de até cancelar uma concorrência, quando se perceber que não está sendo feita a melhor compra", afirmou o ministro da Saúde, Ricardo Barros. O sistema é destinado ao registro e a consulta de informações de compras de medicamentos e produtos para a saúde adquiridos no âmbito do SUS. Segundo o ministério, gradualmente, outros produtos, além dos medicamentos, também terão seu registro obrigatório no BPS. A medida foi pactuada na Comissão Intergestores Tripartite, que reúne gestores de saúde dos estados, municípios e União. O Banco de Preços em Saúde vai oferecer informações qualificadas de preços praticados nas aquisições de medicamentos e produtos para a saúde. Esses dados vão poder ser consultados de forma regionalizada, por modalidade de compra, tipo de compra, faixa de quantidades adquiridas, por fabricantes e fornecedores, dentre outras possibilidades de pesquisa. Levantamento preliminar feito pelo Ministério da Saúde junto aos gestores que já utilizavam voluntariamente o Banco de Preços em Saúde, em novembro de 2016, apontou que 73% dos participantes conseguiram reduzir os preços junto a fornecedores nas licitações ou compras diretas. Os dados até o momento apontam ainda que, com a utilização do banco, anualmente é possível reduzir o valor total estimado nos contratos ou mesmo a substituição gradual da pesquisa de preços feita diretamente junto a fornecedores e fabricantes. O estudo segue até dezembro.
Alexya Salvador, de 36 anos, costuma dizer que “nasceu e cresceu”
na Igreja Católica. Durante quatro anos, até frequentou um seminário
para seguir o sacerdócio. Contudo, quanto mais o tempo passava, menos
encontrava acolhimento naquela religião. Em 2009, há um ano sem ir à
missa e ainda com identidade masculina, procurou uma igreja para casar
com o professor de matemática Rodrigo Salvador, de 28.
Ao visitar o primeiro culto, avistou uma drag queen no púlpito e
já soube que passaria a frequentar a Igreja Comunidade Metropolitana
(ICM), pioneira mundial na chamada “teologia inclusiva” e fundada em
1968 nos Estados Unidos. “Sempre tive um chamado espiritual muito forte.
Era muito difícil para mim não poder exercer isso”, diz. Ao lado da
ICM, São Paulo tem ao menos outras três igrejas protestantes abertas à
comunidade LGBT: a Igreja Contemporânea Cristã, a Comunidade Cristã Nova
Esperança e a Cidade de Refúgio.
Diante desse espaço restrito e também pela pressão política de
bancadas religiosas contra reivindicações da causa LGBT, a Associação da
21.ª Parada do Orgulho LGBT escolheu o tema “Independente de nossas
crenças, nenhuma religião é Lei! Todas e todos por um Estado Laico” para
a edição de 2017, que ocorre neste domingo, 18, a partir das 10 horas,
na Avenida Paulista.
A história de Alexya ainda é, portanto, uma exceção. Ela relata
que, se tivesse encontrado o conforto que a ICM lhe trouxe,
possivelmente teria feito a transição de gênero antes, o que ocorreu
apenas em 2012. “Por volta dos 22 anos, disse que era gay, o que não era
verdade. Eu me sentia atraída por homens, mas não me considerava um”,
relembra. Só por se declarar homossexual, teve de deixar atividades da
paróquia que frequentava naquela época, como a catequese.
Hoje pastora auxiliar em um templo em Santa Cecília, zona oeste
de São Paulo, Alexya deve tornar-se a primeira reverenda transgênero da
ICM na América Latina ainda neste ano. Nos cultos, utiliza uma batina
preta com colarinho branco, parecida com a que é utilizada por padres
católicos, religião que detém rituais litúrgicos parecidos. Além das
atividades na igreja, é professora de geografia e tem dois filhos,
Gabriel, de 12 anos, e Ana Maria, de 10 anos, que também é transgênero.
A pastora participa anualmente da Parada LGBT, mas relata haver
pouco diálogo entre as igrejas inclusivas. “Fico feliz que existam
outras. Acho que a gente deveria ser mais unido. Até porque pessoas LGBT
têm pavor de religião, porque foram oprimidas a vida toda por dogmas
religiosos. A gente tem de desconstruir esses dogmas e mostrar uma
doutrina de amor”, argumenta.
Dentre os temas que dividem a teologia inclusiva estão o consumo
de pornografia, bebidas alcoólicas e sexo antes do casamento, além de
outros costumeiramente condenados em religiões protestantes. “Na ICM,
dizemos que a sua cabeça é o seu guia. Não tem razão para proibir
bebida, balada, carnaval, se isso não faz mal nem para mim nem para o
outro. Até brinco que sexo antes do casamento não tem problema também
desde que não atrase a hora da celebração.”
Cidade de Refúgio. Na quarta-feira, o Estado visitou um culto de
uma das maiores igrejas abertas a LGBTs do Brasil, a Cidade Refúgio, que
tem a sua principal sede na Avenida São João, no centro de São Paulo.
Ela foi criada em 2011, pelo casal de pastoras Lanna Holder, de 42 anos,
e Rosania Rocha, de 44, que deixaram a igreja e os respectivos
casamentos após se conhecerem.
Com o tema “Vencendo traumas”, o culto reuniu cerca de 250 fiéis,
em sua a maioria gays, lésbicas e bissexuais entre 20 e 40 anos, embora
também houvesse crianças, idosos e casais heterossexuais. No início, a
pastora Rosania e outros integrantes da igreja cantavam versos como “ao
Deus da minha vida, que me compreendeu sem nenhuma explicação”. Fiéis
erguiam os braços, alguns muito emocionados. Outros, gritavam “aleluia”.
Na frente do altar, um rapaz e duas moças vestiam túnicas cor-de-rosa e
dançavam.
Em seguida, a pastora Lanna começou o sermão, no qual comparou a
história de abandono e abusos sofrida por Jefté, no Antigo Testamento,
com o que ela e outras pessoas LGBT viveram. “Jefté vivenciou a dor de
um filho desprotegido. Quantos de nós não vivenciamos essa dor?”,
questionou a pastora. “Mas Deus nunca foi indiferente com você. Está
cuidando de nós nos mínimos detalhes.”
Durante o culto, assistido por ao menos 227 pessoas pela
internet, Lanna lembrou os apelidos pejorativos que muitos de seus fiéis
já ouviram. “Você não é o maricas que falavam que você era”, disse.
Logo depois, em tom descontraído, condenou relações antes do casamento.
“Não precisa fazer ‘test drive’. Fala ‘eu sou passivo’, eu ‘sou ativo’ e
só. A gente faz uma análise histórico-crítica da Bíblia, mas não
podemos mudar o que ela defende.”
Dentre os frequentadores, muitos estavam à vontade em demonstrar
afeto com pessoas do mesmo gênero, seja por estar de mãos dadas ou
abraçados. Dentre eles estavam a pedagoga Cris Rosa, de 34 anos, que
conheceu Marta Almeida, de 48, na igreja que frequenta há seis anos.
Elas se casaram há dois anos naquele mesmo local, com Cris usando
um vestido com temática africana. “A primeira vez que eu vim, foi para
provocar a Lanna. Eu odiava ela. Achava que ela ainda era uma (Silas)
Malafaia de saias, que se dizia ex-lésbica curada”, lembra, ao se
referir ao passado da pastora na Assembleia de Deus. “Vim cheia de
desaforo, achando que iria detestar, mas chorei o culto inteiro. Nunca
mais saí daqui.”
Umbanda e candomblé são mais receptivos
O psiquiatra Marcelo Niel, de 43 anos, começou a frequentar
terreiros de umbanda por volta dos 20 anos, quando ainda cursava a
faculdade de Medicina. Foi 10 anos depois, contudo, que passou a se
declarar gay. Hoje filho de santo no candomblé, Niel estuda as duas
religiões em seu doutorado em Antropologia. Segundo ele, a receptividade
aos LGBTs depende dos responsáveis pelas casas ou terreiros.
Mas um dos motivos pelo qual Niel atribui o maior espaço no
candomblé, por exemplo, é que cada pessoa se reporta ao seu orixá, que
pode tanto ser homem quanto mulher. Dentro dos mitos da religião, há
casos de orixás andrógenos que se envolveram com figuras do mesmo
gênero, como Xangô, considerado o mais viril dentre os orixás. “A gente
tem uma relação muito próxima com o nosso orixá, de modo que se acredita
até que eles influenciam nossas ações”, diz.
Já na umbanda, a crença é mais voltada para o aspecto espiritual,
conforme explica Pai Joãozinho Galerani, do Terreiro da Vó Benedita, de
Campinas. “Na minha casa, sempre digo que somos todos iguais e temos
que primar pelo amor.”