Universidade de Michigan
Mas Mauricio não é um jovem qualquer, conta reportagem publicada pelo Portal EcoD, que dissemina informações sobre desenvolvimento sustentável.
Maurício Almeida veio ao mundo com apenas seis meses. Na incubadora, o ar deslocou permanentemente sua retina, que desde então só deixa passar contornos e cores. Apesar da deficiência visual, Mauricio entrou na universidade por meio do processo seletivo normal.
A deficiência, porém, não o limitou. Ele nunca estudou em escolas especiais, trocou o braile pelos softwares específicos para deficientes visuais, ganhou fluência em inglês com jogos na internet e foi professor voluntário.
A paixão pelos jogos online é tão grande que, em fevereiro, ele abriu sua própria empresa, WebMegaSpace, site de hospedagem virtual. Paralelamente, ele obteve, em maio, dois diplomas e meio: o brasileiro, o americano e metade do europeu.
Mauricio considera que leva à vida como qualquer outro adolescente. Ele gosta de sair à noite com os amigos para beber uísque. “As pessoas simplesmente não imaginam quem não enxerga fazendo coisas que elas conseguem fazer”, afirmou.
A motivação maior do garoto, no entanto, está nas entrelinhas: a família. “Meu pai sempre falou, tanto para mim quanto para meus irmãos: ‘Se você quer alguma coisa, a gente vai ajudar. Mas quem vai ter que correr atrás é você’”.
E o garoto seguiu o conselho e foi atrás dos seus objetivos. A aprovação em Michigan chegou antes de, até mesmo, ele cogitar fazer vestibular no Brasil. “Não sinto minha deficiência como um problema”, decretou.
Confira a seguir a entrevista que Mauricio Almeida concedeu exclusivamente ao EcoD, por telefone.
EcoD: de alguma forma, sua deficiência te limitou ou te ajudou?
Mauricio Almeida: a deficiência, na verdade, foi um dos motivos principais que hoje estou aqui. Eu usava o braile como forma de estudar, fui passando para a informática aos poucos. Nessa transferência acabei me apaixonando pela informática e vi que realmente era o que eu queria fazer. A pessoa que enxerga pode até não ficar sem internet, mas para quem tem deficiência visual a internet abre muitas portas, porque não oferece limitação.
Você acredita que há um estigma do deficiente visual na sociedade como o “coitadinho”?
Na verdade, hoje em dia, comparado com quatro, cinco anos atrás, melhorou muito. Mas ainda existe. A realidade é que a pessoa vê você na rua e fala ‘olha como ele anda!’. Geralmente, por falta de conhecimento mesmo, não por preconceito. Elas simplesmente não imaginam as pessoas que não enxergam fazendo coisas que elas conseguem fazer.
Você sempre estudou em escolas ditas “normais” e até chegou a declarar que a adaptação tinha que ser sua...
Quando eu falo que é adaptação é minha, é porque ela tem que ser minha. A sociedade, é claro, tem que oferecer uma estrutura básica para eu poder me adaptar, senão não dá. Por exemplo, tem que ter calçadas adequadas, assistência em lugares públicos. Por outro lado, as pessoas têm que correr atrás. Não adianta eu ficar esperando meu diploma vir até a mim.
A deficiência já te impediu de fazer alguma coisa?
Nunca me impediu... É claro que eu não fui totalmente independente desde pequeno. Eu não saía sozinho aos 12 ou 13 anos. Mas é como acontece com qualquer jovem: uma menina de uma classe social mais confortável também não sai sozinha. Eu tenho minhas limitações. São Paulo não é um lugar fácil, minha família demorou um pouquinho para me soltar mais. Mas não sinto minha deficiência como um problema.
E quais são suas expectativas em relação ao futuro? Pretende voltar ao Brasil após se formar?
A única coisa que posso te garantir hoje é que eu sempre vou trabalhar para o Brasil, seja onde estiver. Eu quero voltar. Até porque a empresa está aqui e vou continuar tocando ela de lá. Eu pretendo voltar sim. Até porque o país precisa de gente boa e se todo mundo vai embora, a gente não pode reclamar. Mas eu tenho plena consciência que as coisas podem mudar. Então, eu sigo essa lógica: o que eu posso fazer eu vou fazer, mas onde eu não posso ter certeza.
Qual recado que você daria para os jovens que vêem dificuldades...
Ah! Eu adoro dar recado! Eu gosto de dar entrevistas não é para falar de mim, mas para ter espaço para esses jovens. Tem muitos jovens que se sentem diferentes nos lugares que estão, se sentem deslocados – não que tenham amigos, não saiam, nada disso. Mas que eles param para pensar e vêem o quanto são diferentes, o quanto eles querem mudar alguma coisa. A maioria dos meus amigos falam ‘para que fazer isso?’, ‘nunca vai mudar mesmo’.
Eu fui assim muito tempo. Eu queria mudar e não sabia como. Eu hoje eu estou tentando porque eu arrisquei. Vi onde estava, o que eu podia fazer, a minha importância. O recado que eu dou é: tentem, corram atrás. Não achem que uma pessoa só muda o mundo, mas tentem, arrisquem. Eu acho que no Brasil falta risco. O jovem brasileiro chegou a um ponto que ele não acredita mais em arriscar para mudar.