Muitas vezes o transtorno é confundido com depressão porque, na maioria dos casos, o psiquiatra é procurado na fase depressiva da doença, quando os sintomas não são muito diferentes dos de quadros depressivos
Estudos americanos mostram que os portadores de transtorno bipolar levam até 14 anos, desde a primeira consulta ao psiquiatra, para ter o diagnóstico correto. É o que alerta a professora de psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília, Maria das Graças de Oliveira. A especialista conta que muitas vezes esse transtorno é confundido com depressão porque, na maioria dos casos, o psiquiatra é procurado na fase depressiva da doença, quando os sintomas não são muito diferentes dos de quadros depressivos a que qualquer pessoa está sujeita.
O transtorno bipolar é caracterizado por alterações
de humor que se manifestam como episódios depressivos que se alternam
com estado de euforia, também denominados de mania, podendo se
manifestar em diversos graus de intensidade. Ângela Scippa, presidente
da Associação Brasileira de Transtorno Bipolar (ABTB), alerta que entre
30% e 60% dos diagnósticos de depressão escondem um caso de transtorno
bipolar.
Maria das Graças explica que na fase de euforia o
paciente sente-se muito bem. “Quando estão em hipomania [quadro mais
leve de euforia], a pessoa não procura ajuda porque sente-se bem,
eufórica, com agilidade mental, sentimento de confiança, ego mais
inflado, sente-se mais poderosa, um estado que geralmente não a leva a
procurar ajuda de um psiquiatra”, explica a especialista. Se o médico
não perguntar insistentemente pelo sintoma da hipomania, eles não vão
contar, portanto, muitos pacientes acabam recebendo diagnóstico de
depressão, quando na verdade é transtorno bipolar.
“Esses pacientes têm biografias que são verdadeiras
montanhas-russas. São pessoas que passam por vários casamentos, que
têm dificuldade em crescer profissionalmente, histórico de demissões ou
de falências. Cada episódio de depressão ou de exaltação de humor pode
ter consequências muito ruins para a vida do paciente”, destacou
Graça.
Fernando*, professor de educação física, 27 anos,
hoje sabe que tem transtorno bipolar. Mas, aos 13 anos, foi
diagnosticado com depressão. “Na minha infância, antes dos 10 anos de
idade, comecei a apresentar sinais de irritabilidade, agressividade,
comecei a ser levado a psicólogos, psiquiatras. Só aos 16 fui
diagnosticado com transtorno bipolar”, conta.
Depois de 11 anos de tratamento, Fernando disse que
passou a perceber quando está entrando em crise e toma as providências
para se controlar e “não machucar” e ofender outras pessoas. “No meu
tempo de colégio eu cheguei a agredir tão fortemente um colega que ele
desmaiou e foi parar no hospital, eu virava o verdadeiro Hulk
[personagem de filme] nas crises de depressão”, contou. No caso dele, a
agressividade é um sintoma de sua crise depressiva.
Na fase de euforia, Fernando conta que fica
brincalhão e cheio de si. “Eu me sinto literalmente o Super-Homem, você
acha que pode tudo, que é inatingível, chegam cinco pessoas querendo
bater em você e acha que pode enfrentá-las. Falta achar que sabe voar”
relatou.
Ângela também conta que há casos mais leves em que
as pessoas convivem com a doença por toda a vida, sem ter um
diagnóstico. “Alguns descobrem a doença aos 80 anos, para ter ideia.
Isso ocorre em pessoas que têm a doença de forma leve e que, por isso,
nunca notaram a necessidade de um tratamento. Mas, hoje, com a ajuda
da mídia, as pessoas estão mais atentas e com mais informações em
relação ao transtorno bipolar, o que diminui casos de descoberta
tardia” explica.