Jolivaldo Freitas
Quando a imperatriz dona Carlota Joaquina aqui desembarcou na comitiva do seu marido Dom João VI lá pelos idos de 1808 já foi torcendo o nariz.
Era grande a fedentina, e que só perdia para o Rio de Janeiro. Era
costume na época fazer o que se costuma chamar de “pombo sem asa”.
Enrolar o cocô num pano ou papel, ou mesmo na folha de bananeira e
arremessar pela janela. Era preciso andar atento pelas ruas da Bahia
para não levar merda pelos chifres.
Mijo era um problema toda matina. As famílias passavam a madrugada a
mijar e quando o dia amanhecia o conteúdo do penico era arremessado pela
janela e quem quisesse que saísse de baixo para não levar o líquido
maturado pelas fuças.
Quem tinha escravo se dava ao luxo de obrigá-los a carregar seus
dejetos até a área de descarte. Quem não tinha mandava pelos ares e
ficava por isso mesmo. Daí tanta doença que matava a todos,
indistintamente.
Até hoje se diz do hábito baiano de mijar na rua como uma herança
portuguesa e os portugueses sempre tiveram a fama de serem inimigos dos
bons hábitos.
Lembro de seu Pereira, de uma casa comercial lá da Pedra Furada, do
enclave do Mont Serrat, bucólico endereço da capital baiana, que tinha a
mania de tirar meleca e limpar na camisa. Depois servia o pão. Está
pensado que o pessoal deixava de comprar? Era a padaria mais perto e o
jeito era passar um pano no pão para ter a impressão que se limpava a
nojeira.
Conheci há cerca de cinco anos no Porto da Barra outro português de
nome Pedro Malheiros, que tem péssimos hábitos de higiene. Não gosta de
banho e, como mora sozinho, coloca o prato usado na geladeira para usar
em seguida.
Diz-me que se vai sujar de novo para que limpar. Ele usa a mesma
bermuda desde o tempo em que o conheci. E come coxinha de galinha com as
mãos e limpa os dedos na imunda toalha da mesa. Coisa que, dizem,
lembra dom João VI, que fazia a mesma coisa.
Mas não podemos culpar os portugueses pelos problemas de maus hábitos atuais.
O site da Tribuna da Bahia fez uma enquete para saber o que mais
incomoda o baiano e 35,1 por cento dizem que é a falta de educação.
Apesar de termos mais gente formada, nas escolas ou com trato social
mais amplo, as pessoas continuam a jogar papel de balinha, copos e até
celular quebrado pela janela do carro (o que mostra que a falta de
educação extrapola a classe social).
Homens e mulheres fazem como os cachorros e urinam no pneu do carro,
nas paredes e tem até um viaduto em Salvador que pode cair de tanto
levar urina e sua estrutura está comprometida.
No início do século passado um dos grandes motivos de brigas na Bahia era o hábito que se tinha se mascar fumo.
O trabalhador colocava seu melhor linho branco, passava embaixo de
uma janela e levava uma catarrada preta. Todo mascador de fumo tinha a
mania de cuspir por cima do parapeito das janelas.
E mancha de fumo na roupa branca não saia nem lavando com pedra, alvejante ou anil.
Parece que hoje o problema é maior que no passado. No ônibus senta-se
no lugar dos idosos, fingindo dormir para não ter de sair. Na praia
anda-se de sandálias jogando areia na cara de quem está espraiado ao
sol.
No cinema o indigitado fala no celular o tempo todo. No teatro a
plateia quer interagir com os atores mesmo em cena de morte. Nos
hospitais, SACs, supermercados, bancos, etc a recepcionista não dá bom
dia e nem quer informar, embora seja sua função. Nos restaurantes se
fala de boca cheia e se conta a vida dos outros em altos tons, sem
desfaçatez.
A Bahia continua mal educada, fofoqueira e abusada. Imagine o que não
faria hoje a dona imperatriz Carlota Joaquina, que morria de nojo do
Brasil? E você que joga óleo na pia, invade fila, arremessa lixo na rua,
buzina, cospe na calçada, atira latinha de cerveja ou refrigerante no
chão, fala alto e coloca o som do carro na estratosfera? Te conheço.