Marta Suplicy foi deputada,
prefeita de São Paulo, ministra do Turismo, da Cultura e atualmente cumpre
mandato de senadora. Sempre pelo PT, partido em que milita desde o início da
década de 80. Trinta e cinco anos, de muitas vitórias e algumas derrotas, um
mensalão e um petrolão depois, que descreve como uma "avalanche de
corrupção", ela decidiu deixar a legenda a que dedicou metade de sua vida.
Marta tem convite de quase todos os partidos políticos do Brasil, mas se
inclina mais para o PSB de Eduardo Campos, o candidato morto em um desastre de
avião na campanha presidencial do ano passado. Enquanto desenhava estrelinhas
em uma folha de papel, Marta falou a VEJA de seus motivos para romper com o PT
e de seu "projeto de nação".
A senhora saiu do PT ou o PT a
deixou antes? Tenho muito orgulho de ter ajudado a fundar o PT. Acreditei, me
envolvi, trabalhei décadas, com dedicação total. Saio do PT porque,
simplesmente, não é o partido que ajudei a criar. O PT se distanciou dos seus
princípios éticos, das suas bases e de seus ideais. Dessa forma traiu milhões
de eleitores e simpatizantes. Eu sou mais uma entre as pessoas que se
decepcionaram com o PT e não enxergam a possibilidade de o partido retomar sua
essência. Respondendo a sua pergunta, estou segura de que meus princípios nunca
mudaram, são os mesmos da fundação do PT, os mesmos com os quais criei os meus
três filhos. Agora tenho um desafio, o desafio do novo. Quero ter um projeto
para o meu país. Um projeto em que acredite. É isso que eu vou buscar.
O que mais pesou na sua decisão?
O componente ético é muito forte. A decepção foi tremenda. Não foi fácil ver os
integrantes da cúpula do partido na prisão. Discordo da maneira pública pela
qual eles foram julgados e sentenciados. O processo judicial pode ter sido
perfeito, mas a humilhação pública que eles sofreram não se justifica. Por essa
razão eu não me manifestei durante o julgamento do mensalão. Mas senti que
havia um profundo distanciamento do que nós, petistas, queríamos para o Brasil.
Reconheço o muito que já se fez em termos de diminuição da pobreza e do aumento
da mobilidade social. Mas eu percebo também que a cúpula se fechou e, cercada
por interesses corporativistas de certos movimentos sociais e sindicalistas,
trabalha apenas para se manter no poder. O PT não tem mais projeto para o Brasil.
Se não recuperar seus princípios éticos, da fundação, não voltar às suas bases,
se ficar só no corporativismo, o PT vai virar uma pequena agremiação. Teria
chance se fosse no caminho oposto, mantendo sua base social, mas incorporando
uma classe média que ele mesmo ajudou a criar. Mas, se você perguntar se o PT
fará o que é preciso para se salvar, minha é resposta é não.
Houve uma gota d'água? A escolha
do Fernando Haddad para ser candidato à prefeitura de São Paulo, em 2012, foi
muito difícil para mim. Mas respirei fundo e fiz campanha para ele. Sei que
minha participação foi fundamental para a vitória do Haddad. Antes já tinha
sido praticamente abandonada na minha eleição para o Senado. Ganhei com enorme
dificuldade. O PT fez campanha muito mais forte para o candidato Netinho do que
para mim. Então comecei a pensar no que estava fazendo no PT. Em 2014, meu nome
nem foi cogitado para a corrida ao governo de São Paulo, embora eu tivesse 30%
das intenções de voto. Aí vem essa avalanche de corrupção. Engoli muita coisa
na política. Mas, quando vi que estava em um partido que não tem mais nada a
ver comigo, que não luta pelas bandeiras pelas quais eu me bati e que ainda me
tolhe as possibilidades - e eu sei que sou boa -, a decisão de sair ficou
fácil.
A senhora não viu os sinais da
"avalanche de corrupção" no PT? Não, porque eu nunca participei
disso. Não tinha a mais leve ideia. Como a maioria dos petistas não tinha
também. Se você não estava ali naquela meia dúzia, você não sabia.
Quando ficou evidente sua saída,
a máquina de destruição de reputações do partido começou a agir com a acusação
de que a senhora, uma aristocrata, nunca foi realmente do PT. Isso magoa?Essas
pessoas nunca estiveram na minha pele. Dei ao PT uma cara de classe média
palatável. Isso abriu outro horizonte, com a adesão de uma classe média que não
se identificava com o sindicalismo. Se não posso dizer que a inventei, tenho
certeza de que contribuí muito para a modernidade do PT. Esse tipo de crítica
não me afeta.
A senhora teve um papel de
destaque no "Volta, Lula", movimento para afastar Dilma e lançar como
candidato o ex-presidente. Por quê? Eu tinha certeza de que, se a Dilma
vencesse, teria um segundo mandato muito difícil, como está sendo efetivamente.
Achava que com o Lula teríamos condição de rever com clareza os erros cometidos
e, assim, reunir força política para tirar o Brasil daquela situação. A maioria
dos deputados e dos senadores preferia a candidatura do Lula pelas mesmas
razões que as minhas. Eles só foram mais cuidadosos.
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