Há 13 anos, Renata Rebello, de 53 anos, era Ruy Cabral Rebello. Um
homem que tinha um filho, mulher e família. Durante 40 anos, Ruy quis
ser Renata, mas, em nome dos "bons costumes" e por medo da rejeição,
resolveu escondê-la no armário.
"Eu era uma mulher no corpo de um homem. Durante 40 anos, me escondi.
Entrei em depressão e no mundo das drogas. Não me sentia feliz", conta
ela, que é natural de Porto Alegre.
Há 13 anos, Ruy resolveu assumir a Renata que existia dentro de si.
Saiu da sua cidade natal, passou um tempo em São Paulo e depois veio
morar em Salvador.
"Coloquei uma saia, um salto, uma peruca e fui para o shopping", diz
ela, que, antes de tomar esta atitude, só se vestia de mulher em algumas
ocasiões, na noite, com os amigos.
O nome de batismo não foi escolhido ao acaso. "Me rebatizei de Renata porque significa a renascida".
Renata hoje se considera uma mulher realizada, mas a dívida que paga,
desde então, é alta. Quando permitiu que Ruy se fosse, o viu levar com
ele as melhores coisas que tinha na vida: o filho - que hoje é um homem
de 31 anos - e toda a família.
Custo
"O custo social que uma travesti paga ao se assumir é muito alto. Minha família deixou de me ter como parte dela, todos deixaram de falar comigo, meu filho diz que não tem mais pai. É muito difícil lidar com essa rejeição, mas hoje sou o que sempre me senti, uma mulher".
"O custo social que uma travesti paga ao se assumir é muito alto. Minha família deixou de me ter como parte dela, todos deixaram de falar comigo, meu filho diz que não tem mais pai. É muito difícil lidar com essa rejeição, mas hoje sou o que sempre me senti, uma mulher".
Assim como acontece com outras famílias, além da possibilidade de
rejeição por conta de uma das partes ter assumido a homossexualidade,
não é incomum que a família do casal tenha receio de que o filho - seja
ele biológico ou adotivo - acabe sendo influenciado pela orientação
sexual do pai ou da mãe.
"Crianças gays, assim como crianças heterossexuais, lésbicas,
transexuais e bissexuais saem de todos os tipos de lar, sejam eles
homoparentais, monoparentais, famílias reconstituídas, famílias
tradicionais, lares adotivos ou não", afirma o psicólogo e mestrando do
Grupo de Pesquisa em Cultura e Sociedade (CUS) da Universidade Federal
da Bahia (Ufba) Adriano Cysneiros.
Segundo ele, as pesquisas mostram que as crianças que têm a
oportunidade de se desenvolver num lar mais aberto à diferença, de
experimentar o cuidado atento para com suas necessidades, e decisões
democráticas tomadas em grupo, têm um desenvolvimento mais saudável e
mais orientado para o respeito a todas as diferenças por não
reconhecê-las como ameaça.
A informação é ratificada pelo antropólogo e fundador do Grupo Gay da
Bahia (GGB), Luiz Mott. "Se a lógica fosse essa, seria difícil explicar
como filhos gays nascem de casais heterossexuais. A proporção, de acordo
com as pesquisas, é a mesma. Em torno de 10% dos filhos de casais gays
ou heterossexuais serão também gays", diz Mott, pais de duas filhas
heterossexuais.