Meu sonho sempre foi trabalhar com Direito. Uma vez me perguntaram: como
é o caminho de empregada a ministra? Olha, foi tão longo que nem dá
para fazer uma ligação direta.
Fui doméstica aos 15 anos, em Pontalina (GO), para ajudar a custear meus
estudos, comprar livros. Fiquei nesse emprego por um ano.
A segunda ocasião foi ao sair da minha cidade. Fui para Goiânia e
trabalhei em uma república de moças. Eu morava lá, mas não pagava
aluguel, prestava esses serviços. Fiquei lá seis meses.
Sou a filha mais velha de nove irmãos. Fui a primeira a sair de casa e a
primeira a me formar no nível superior. Depois de mim, outros irmãos
também fizeram faculdade.
Desde menina me dei conta de que a situação financeira da minha família
era muito ruim. Vovó dizia que tinha receio de a minha mãe passar
dificuldade. Eu pensava: vou ajudar meus pais.
Lembro de pedir a Deus para me ajudar a conseguir estudar. Papai me
dizia que era muito difícil, éramos muitos filhos e eles não tinham
recursos. Estudei bastante. Minha escola ficava a 2,5 km de casa. Ia e
voltava a pé.
Lembro-me de um episódio em que um primo foi me ajudar a arrumar um
emprego. Ele ligou para um político que frequentou a casa do meu avô e,
quando explicou quem eu era, o interlocutor emendou: "Neta do Cipriano
não pode ser".
O que ele queria dizer era: aquela família era tão simples que eu não
poderia ter preparo para trabalhar em um escritório de advocacia.
Trabalhei lá por seis meses.
Pedro Ladeira/Folhapress | ||
A ministra do TST Delaíde Arantes, em seu gabinete |
No interior existem poucas atividades culturais. Em Pontalina só tinha uma sala de cinema, que exibia filmes alguns dias do mês.
O que tinha sempre era seção do Tribunal do Júri. A população ia lá assistir e ficava encantada. Eu também.
Sempre soube que era isso que queria. Fiz contabilidade e depois o curso de direito.
Nesse período, em Goiânia, trabalhei em vários lugares: em loja de
material de construção, recepcionista em construtora e, depois de uma
seleção, fui secretária-executiva de uma multinacional.
Sou uma otimista incorrigível. Gosto de dizer que era feliz como
doméstica, recepcionista, secretária, estagiária. É preciso gostar do
que se faz. Procurei fazer tudo da melhor forma.
Não houve um salto na minha carreira. Foi uma longa e lenta caminhada. Ingressei de corpo e alma na carreira.
Com dez anos de advocacia, passei a ter meu próprio escritório. Depois
de 30 anos surgiu a oportunidade de concorrer a uma vaga no Tribunal
Superior do Trabalho. Concorri com 28 advogados de todo Brasil.
Meus pais são vivos e estão muito orgulhosos de mim.
Eles me apoiam desde pequenininha.