Ladeado por plantações de fumo e milho, um distrito rural no extremo sul
do país mantém a rara tradição de dividir os fiéis luteranos em duas
igrejas, separadas por apenas um quilômetro. Uma delas é "dos negros" e a
outra, "dos alemães".
A origem da divisão está na proibição, no início do século 20, de
ex-escravos e seus descendentes frequentarem os cultos dos imigrantes
que vieram da Europa.
Entrar em uma ou em outra igreja não é mais proibido. O costume de rezar
em templos separados, porém, permanece em Canguçu, município de 53 mil
habitantes a 300 km de Porto Alegre.
A cidade tem o maior percentual de habitantes na zona rural do país
(63%) e é o segundo maior produtor nacional de fumo. A maioria dos
agricultores é de descendentes de alemães ou de remanescentes de
quilombos.
No quarto domingo da Quaresma, em março, a Folha visitou um culto
da congregação Manoel do Rego, fundada em 1927. A maioria dos 28
presentes, de sobrenomes Silva, Borges e Souza, eram negros quilombolas.
Perto dali, andando por uma estrada de terra margeada por casas simples
do distrito de Solidez, chega-se à congregação Redentora, dos alemães. O
pastor de ambas igrejas é Edgar Quandt, 62, descendente de europeus.